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Rio de Janeiro, década de 20. A Cidade
Maravilhosa está nos arquivos da Cinemateca e nos livros de História.
Imagens de um tempo inesquecível em branco e preto. Mas, nas memórias da
escritora Maria Augusta Machado, de 93 anos, elas estão fresquinhas,
cheias de cores e detalhes.
"Eu lembro quando foi declarada a guerra", conta ela. Neurônios
afiados. Quem não gostaria de chegar a essa idade como ela? "Conheci o
Corcovado sem estátua", recorda.
Grandes vultos do passado? Nas lembranças de dona Maria Augusta,
parecem velhos conhecidos. "Ele tinha um chapéu meio inclinado. Era um
homem baixinho, magrinho, esquisitinho, que ficava vendo as crianças
brincarem. Mas eu não sabia quem era porque nunca contavam às crianças.
Era Santos Dumont. Cansei de vê-lo sentado", afirma.
Os avanços da medicina estão fazendo o homem viver mais e melhor.
Mas, às vezes, o cérebro não acompanha, falha, sofre com as chamadas
enfermidades da velhice, como o Alzheimer, a doença do esquecimento.
Para vencer esse mal, a ciência está diante do seu maior desafio:
decifrar o enigma do órgão que comanda nossa existência.
Desde os primeiros passos, das primeiras palavras da infância, a
uma vida repleta de realizações, de experiências e memórias, tudo que se
vive passa pelos misteriosos caminhos do cérebro. Segundo os
cientistas, o amor, o ódio, o trabalho, até um simples movimento de dedo
de mão ou um passo podem ser traduzidos em impulsos elétricos e
químicos que acontecem dentro da nossa cabeça. São bilhões de neurônios
formando um intrincado labirinto que a ciência tenta desvendar há cinco
mil anos. O Globo Repórter percorreu uma parte desse extraordinário mapa
da vida.
Nosso cérebro é resultado da vida que levamos. A diferença entre a
lucidez e a demência pode estar na nossa rotina – até mesmo no que
comemos. Mas e o que bebemos?
Nos laboratórios da Universidade do Vale do Rio dos Sinos
(Unisinos), no Rio Grande do Sul, cientistas pesquisam o soro da
memória, um líquido que pode fazer a cabeça funcionar melhor. Concentra
componentes poderosos, uma espécie de banquete natural para os
neurônios.
"Tem proteínas e lipídios. Essas substâncias, cada uma de seu
jeito, atuam ajudando os neurônios a fazer suas redes. Elas atuam em um
momento importante, que é a formação de sinapses, justamente quando
catalisamos tudo aquilo que vimos durante o dia. Apreendemos o conteúdo
durante o sono, basicamente", explica a nutricionista Denize Ziegler, da
Unisinos.
Mas de onde vem a poção quase milagrosa? Do soro do leite.
"O soro é a parte líquida do leite. As pessoas podem perguntar:
'Como, se o leite todo é líquido?'. Sim, ele é líquido, mas é a emulsão
de várias substâncias dentro de um líquido. Separando a parte branca,
fica a água do leite", esclarece a nutricionista.
Ciência pura que dá para fazer em casa. Mas atenção: não é
qualquer leite que carrega o segredo do soro da memória. Leite de
caixinha e em pó não funcionam. De acordo com os cientistas, o processo
industrial acaba com os preciosos ingredientes que agem no cérebro. A
pesquisadora recomenda o leite em saquinho, tipo A ou B.
Anote aí a receita do soro:
- Para cada litro de leite, misture o suco de um limão inteiro. - Deixe descansar de quatro a doze horas até coagular. - Depois, separe a parte sólida da líquida com uma peneira bem fina. O que sobra é o soro da memória.
"Ele é insípido, não tem gosto. Um gole não faz grande feito. O
importante dos alimentos que servem como coadjuvantes da saúde é que
eles sejam consumidos com o tempo. Estudos mostram que em três meses
nota-se uma diferença na memória e no sono. Tomando meio copo antes de
dormir durante três meses, há uma diferença interessante. Você vai
conseguir descansar melhor, deixar o cérebro mais tranqüilo. Em
conseqüência disso, vai ter um melhor aprendizado das tarefas que você
realiza", diz a nutricionista.
Dura de três a cinco dias na geladeira. Também pode ser
congelado. O processo é bem parecido com o que acontece nas fábricas de
queijo. Mas qual é o destino dos milhões de litros de soro que o Brasil
produz todos os dias? Na Europa, por exemplo, o soro do leite tem
destino nobre: ele é transformado em pó e adicionado a massas e
biscoitos e também vendido nos mercados como bebida para crianças e
adultos. No Brasil, apesar de a ciência já conhecer os poderes do
alimento, o soro da memória acaba na grande maioria das vezes jogado aos
porcos.
Só em uma fábrica de queijo 70 toneladas por mês vão para o
carro-pipa da fazenda da suinocultora Karmen Scheuer, em Marques de
Souza, Rio Grande do Sul. Todo dia tem carregamento.
"Quatro mil litros custam R$ 20. É barato, mas é uma ajuda para
laticínios. Se quiséssemos, poderíamos conseguir de graça, porque eles
têm problemas com o meio ambiente. Eles têm que dar sumiço ao produto
que sobra. É um lixo dos laticínios", diz a suinocultora.
Como registrar para sempre as lembranças mais importantes
Mas o soro, sozinho, não faz milagre. Em um laboratório da PUC do
Rio Grande do Sul, a equipe do professor Iván Izquierdo fez uma
descoberta surpreendente: a diferença entre as lembranças que ficam e as
que desaparecem para sempre pode depender do que acontece 12 horas
depois. São as 12 horas mágicas da memória.
Nossos cientistas descobriram que o hipocampo produz uma
substância que consegue encontrar, 12 horas depois, no meio da
gigantesca teia de neurônios, as conexões exatas que formam cada
lembrança. Se você reviver de alguma forma essa lembrança exatas 12
horas depois, a substância produzida pelo hipocampo faz as conexões se
tornarem permanentes.
"Primeira coisa: se você está interessado em algo que acaba de
aprender, pense nisso durante o resto do dia e, entre outras coisas, 12
horas depois. Automaticamente, o cérebro vai fazer isso. Se você não
estiver mais interessado, não pense mais. Aprendeu, tudo bem. Esqueceu,
tudo bem", orienta o neurocientista da PUC do Rio Grande do Sul. |
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